domingo, 26 de dezembro de 2021

Citações | Cartas Para a Minha Avó (Djamila Ribeiro)


  • "Eu jamais esqueceria meus amores primeiro, mas era preciso uma canção cantada com ternura para me lembrar que eles precisam ser eternizados sem dor em demasia. Como essa dor será carregada para sempre, ela não pode nos fazer afundar e esquecer as memórias felizes.” – 14 e 15
  • “Essa imagem de mulher negra forte é muito cruel. As pessoas esquecem de que não somos naturalmente fortes. Precisamos ser porque o Estado e a iniciativa privada são omissos e violentos. Restituir a humanidade também é assumir fragilidades e dores próprias da condição humana. Somos subalternizadas ou somos deusas. E pergunto: quando seremos humanas?” – 15
  • “Preparar para a vida, quando se trata de uma criança negra, é ser brutalizada o bastante para aprender a lidar com a brutalidade do mundo. É um ciclo que se propaga impedindo a gente de ser, somente ser.” – 24
  • “Minha mãe teve suas asas cortadas por muitas tesouras, e dizer a ela que a compreendíamos foi como fazer um pedaço se colar.” – 58
  • Passamos a vida culpando as mulheres que nos criam, assim como muitas vezes culpei minha mãe, sem olhar para quem nos tira o chão, a casa, as oportunidades. Acabamos sempre onerando outras mulheres pela falta de escolhas que nos é imposta. São sempre elas que precisam abrir mão do pouco que têm para alimentar toda a aldeia.” – 65
  • “O racismo também tem dessas: afasta as pessoas negras das culturas que elas mesmas construíram.” – 118
  • “São muitos os obstáculos, as porradas que a gente toma por “ousar” sair do nosso lugar, e nada foi fácil. Apesar de receber muito carinho e ser reconhecido pelo que faço, perceber o afeto daquelas mulheres foi diferente. Foi como me reencontrar com uma história da qual fui apartada. Foi como se elas estivessem me aceitando de volta com os braços abertos, me perdoando. Ali, eu me senti reconectada com uma ancestralidade perdida, uma espécie de volta para casa. Quando aqueles rostos negros se emocionavam por me ver ali, expectadora delas, eu senti vontade de chorar. Os abraços e apertos de mão continham a benção que as mais velhas dão às mais novas, como eu sempre pedia a você e à minha mãe antes de dormir. Elas se emocionavam porque se sentiam representadas pelo trabalho que eu faço. Sim, eu me emocionava com o reconhecimento delas, mas também por sentir que parte da minha história havia sido restaurada.” – 121
  • “... há mãos que condicionam nossas vidas antes de nascermos, coloca sobre nós um imperativo categórico de submissão e competição...” – 129
  • “A importância à frase quem deu foi ela, foi ela que transformou em sonho palavras corriqueiras ditas num dia quente e fez delas um compromisso firmado para a vida inteira... Uma vida de eterna espera, da crença no homem que pode ser mudado por amor.” – 131
  • “A arrogância masculina faz com que se negue ou menospreze tarefas que são fundamentais.” – 132
  • “Algumas mulheres me achavam louca por não me sentir preenchida com a maternidade e a vida de casada. Amava ser mãe ..., mas detestava o que se entendia por maternidade: a abdicação da nossa existência como sujeito.” – 146
  • “... naquele momento, aplaudindo efusivamente ao final de cada música, não existia mais expectativa, havia entrega. Eu não precisava fingir autenticidade, eu simplesmente podia sentir, deixar sair pelos meus poros todas as situações de angústia por não saber qual caminho seguir, deixar escorrer toda mágoa das coisas que não haviam sido, cada ressentimento pelas situações de solidão. Por um breve momento, olhei para o passado sem nostalgia, somente como contingências que me traziam ao agora. Quando ouvi a banda tocar uma canção de amor, me emocionei, mas não de tristeza por amores do passado ou por situações mal resolvidas no meu casamento. Foi um choro de alívio por eu, apesar de todas as pedras no caminho ou as pedras que me atiraram, não ter desistido de mim para poder estar ali, naquele lugar... Aquela mulher de trinta e quatro anos se sentiu plena, como se as asas agora não precisassem mais ser coladas; elas sempre estiveram ali aguardando o momento do voo.” – 170 e 171

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