domingo, 22 de janeiro de 2023

Resenha | Lições (Ian McEwan)

Por Camila Moura


Sinopse:

Enquanto o mundo ainda tenta lidar com as feridas da recém-terminada Segunda Guerra Mundial e a Cortina de Ferro se fecha cada vez mais, a vida de Roland Baines, um menino de onze anos, vira de cabeça para baixo. Em um internato a milhares de quilômetros de sua família, a vulnerabilidade infantil do garoto atrai a professora de piano, Miriam Cornell, deixando marcas profundas e memórias que nunca serão esquecidas. Contudo, já adulto, sua esposa desaparece, deixando-o sozinho com o filho ainda bebê. À medida que o medo da radiação de Tchernóbil se espalha pela Europa, Roland parte em uma busca por respostas que o fará se embrenhar cada vez mais profundamente em seus próprios traumas. Ao mesmo tempo épica história de um homem comum e retrato da Europa dos séculos XX e XXI, Lições é um debate sincero sobre família, Estado e, claro, amor.


Resenha:

Poucos escritores, hoje em dia, conseguem entrelaçar os acontecimentos do mundo de uma forma tão eficaz a ponto de conta uma história, como Ian McEwan.

Na sua nova obra “Lições”, lançada pela editora Companhia dasLetras, o renomado escritor cria uma história sobre como os traumas do mundo vai interferindo na vida nosso jovem protagonista, e como isso desencadeia inúmeros traumas pessoais.

Uma narrativa que começa com o mundo tentando lidar com as feridas da Segunda Guerra Mundial e vai até a pandemia de covid 19. Ao longo desses anos, vamos acompanhando os acontecimentos da vida do Roland Baines, os das pessoas ao seu redor, além dos acontecimentos mundiais.

Esse livro contém uma visão histórica diferente de todos que eu já li, pois o protagonista está diretamente ligado a eles. O seu pai serviu na segunda guerra, o Roland estava presente na queda do muro de Berlim e presenciou a Alemanha dividida, assim como precisou enfrentar o lockdown causado pela Covid 19.

Um fato que eu gostei desse livro é que ele vai alternando entre presente e passado, enquanto o protagonista tenta identificar as motivações que levaram sua esposa a abandonar ele e o filho do casal, de apenas 7 meses. Será que teve alguma relação com os acontecimentos da vida da mãe dela? E assim vamos conhecendo mais da vida das pessoas ao redor do Roland. Além disso, o livro é recheado de questões políticas e nos traz diferentes debates.

Por ser um livro com inúmeros detalhes e acontecimentos, ele se torna uma leitura densa e pode se tornar um pouco cansativa. Por isso, é importante que o leitor se organize em relação ao tempo e tenha paciência para ir avançando na obra e nos diversos fatos que ela traz. É um livro super indicado para quem gosta de romances históricos.

“Como acontecera ao atravessar a França, ficou perplexa com o fato de haver hotéis, assim como pessoas para mudar lençóis e cozinhar o que estivesse disponível. Tão pouco depois de uma guerra total. Fora desses lugares, os alimentos eram escassos. Na beira das estradas, avistar tanques queimados era tudo menos surpreendente. O lixo da guerra estava por todo canto. Numa cidadezinha francesa, a asa enegrecida de um caça estava caída sobre uma calçada. Por razões que ela era incapaz de descobrir, ninguém desejava removê-la. As estradas e estações ferroviárias que se mantinham de pé estavam cheias de pessoas deslocadas, judeus sobreviventes, ex-soldados, ex-prisioneiros de guerra, refugiados da área de controle soviético. Dezenas de milhares estavam amontoados em acampamentos especiais. “Pessoas sem teto, sujeira, fome, sofrimento, amargura” por toda parte."


quinta-feira, 19 de janeiro de 2023

Resenha | Não Se Preocupe - 48 Lições Zen Para Aliviar A Ansiedade (Shunmyo Masuno)

 Por Beatriz Barbosa

O japonês Shunmyo Masuno, após anos de estudo/práticas espirituais traz vários ensinamentos que ele considera fundamental para uma vida mais tranquila, livre de preocupações e angústias desnecessárias.

Na sua obra Não Se Preocupe, lançada no Brasil pela Editora Companhia das Letras, através do Selo Fontanar, Masuno apresenta 48 passos (lições) divididas em 5 partes. 

Na primeira parte ele nos ensina a reduzir, desapegar e deixar para traz.

 “O zen nos ensina a não nos compararmos com os outros”

O autor nos ensina a não termos sentimentos egoístas e não nos iludirmos com sentimentos de inveja e insegurança. A viver no momento presente, não remoer memórias passadas e nem ficar pensando no futuro e sim viver o agora. “More na sua respiração”. Ele nos ensina a viver o Hoje. A não se sobrecarregar ou viver abatido, sobre a necessidade de reduzir a quantidade de pertences “Isso vai tornar a sua mente e o seu corpo mais leve”. E reforça a importância de ser quem é “Simplesmente seja quem você é. Não se concentre nas coisas que você não pode controlar;”

“Pratique a renúncia, não importa sua posição ou seu Status social.” O autor diz que quanto mais nos agarramos as coisas mais os nossos medos desnecessários se intensificam

Na segunda parte do livro ele nos ensina a concentrar apenas no que podemos conquistar no aqui e agora, sendo uma forma que nos ajuda a parar de pensar em coisas desnecessárias.

“Considere o óbvio. Você verá que a felicidade pode ser encontrada no momento presente.”

E ele segue com mais ensinamentos valiosos

“Não se apresse, não entre em pânico. Uma vez por dia faça questão de fazer uma pausa.”

“Responda de maneira positiva. Não há problema em se sentir para baixo, mas logo se levante outra vez.”

“Não vá em busca do que é desnecessário. Pare de consumir informações de forma compulsiva.”

“Não ignore seus sentimentos. Assim, não será afetado pelas coisas.”

Na terceira parte é ensinado sobre a necessidade de parar de competir e assim as coisas naturalmente se encaixam.

“Não se concentre em vitorias ou derrotas. Não importa se você vencer ou perder.”

Shunmyo Masuno reforça que no mundo atual tão cheio de egoísmo as pessoas expressão muito pouco a gratidão e quão importante é nos sentirmos gratos pelas coisas, pelos nossos colegas de trabalho, pelo dia a dia, pela vida e por tudo. E ainda traz um grande alerta, precisamos usar as palavras certas porque existe um preço grande a ser pago se você fizer fofocas e difamações, em um certo momento farão igual conosco. Devemos nos comunicar com o outro com gentileza e usando “palavra afável”.

“Espero que você se lembre disso ­- ao falar com as pessoas com compaixão, sua palavra afável terá o potencial de mover o céu e a terra”.

Na quarta parte o autor traz dicas para aprimorar as relações, trazendo a ideia que não conhecemos as pessoas por acaso e sim por algum motivo que no momento não conseguimos identificar, que em um mundo de quase 7 bilhões de pessoas é quase um milagre as poucas que conhecemos. Essas pessoas que formamos conexões são especiais e no budismo eles consideram essa conexão como innen e por causa do innem esses encontros acontecem  “Quando o carma de causa e o carma de condição estão alinhados”. Então eles acreditam que esses encontros são milagres e presente do próprio buda, então não podemos menosprezar as pessoas que entram em nossa vida.

Na quinta e ultima parte diz sobre transformar a maneira de encarar a vida e viver melhor. Ele cita sobre nossa ânsia de querer cada vez mais dinheiro e quão danoso é uma pessoa se sentir insatisfeita mesmo tento muitos bens. Ele usa uma citação de buda que diz “O desejo humano é tão grande que, mesmo que os Himalaias fossem transformados em ouro, não seria o suficiente.” Masuno ainda reforça que mesmo quando não estamos desejando nada em especifico ainda vamos em busca de dinheiro. Então ele nos questiona, “Você será aquele que conhece a satisfação, ou aquele que nunca consegue se satisfazer? Qual caminho você vai escolher?”


Resenha | Procurando Jane (Heather Marshall)

Ao longo da formação das sociedades, muitos tabus foram sendo criados como formas estratégicas de um grupo prevalecer sobre o outro. Um grande exemplo dessas práticas é o patriarcalismo, que colocou os homens no lugar de poder e de tomada de decisão, relegando as mulheres a uma suposta submissão.

Mesmo com tantas violências às quais as mulheres sofrem, elas sempre ofereceram resistência a esta forma posta e graças a inúmeros sacrifícios e uma grande luta, foram conquistando direitos e se tornando protagonistas da própria história.

É neste contexto de dicotomia entre homens x mulheres e os grandes tabus da sociedade, que a Companhia dasLetras, através do Selo Paralela, lança no Brasil, o livro Procurando Jane, da autora Heather Marshall.

Na obra citada, acompanhamos a história de três mulheres – Evelyn, Nancy e Angela, em diferentes momentos do tempo, que graças a uma carta extraviada, tem suas vidas interligadas para sempre. Nossas protagonistas vão nos trazer em primeira mão acontecimentos históricos, a exemplo da luta pela legalização do aborto no Canadá.

O livro da Marshall tem como tema central a maternidade, o melhor e o pior dela. Para desenvolver esse tema com maestria, a autora fez uma rica pesquisa histórica e apresenta a luta pela legalização do aborto no Canadá, fala sobre adoção, as casas de amparo maternal; o que faz com que a história tenha ainda mais credibilidade e fique carregada de emoções.

A escrita da Marshall é muito rica e delicada. Ela soube construir personagens com inúmeras camadas, fieis aos seus propósitos e reais, nos quais entregam toda a carga emocional que a cena exige. Ainda é possível ver uma mistura de gêneros narrativos – drama, suspense, ação, romance... o livro entrega muito além do que promete.

Procurando Jane é uma obra corajosa, necessária e muito emocional. Ela cumpre seu papel de entreter os leitores, mas principalmente, nos desperta para temas urgentes e que merecem serem discutidos com o cuidado necessário, sem fundamentalismos e nem extremismo, como temos visto atualmente. 

segunda-feira, 16 de janeiro de 2023

Citações | Procurando Jane (Heather Marshall)

 


  • “... as pessoas se arrependem de coisas que não fizeram muito mais do que de erros que de fato cometeram. É a inação que faz alguém acordar de madrugada, duvidando de seu próprio  julgamento. São os ‘e se’ e dos ‘eu deveria ter’ que permanecem nas profundezas da alma. Que se agarram com mais força, que têm os dentes mais afiados.” – 53
  • “... qualquer coisa pode se quebrar de maneira irreparável quando manipulada sem cuidado.” – 268
  • “Se aprendi alguma coisa com tudo isso, é a não guardar segredos. Eles infeccionam com feridas, e levam ainda mais tempo para se curar depois que o estrago foi feito. É algo permanente e incapacitante...” - 280


Citações | Clube da Luta (Chuck Palahniuk)

 



  • “Naquela época a minha vida parecia completa demais, e talvez tenhamos que quebrar tudo para construir algo melhor em nós mesmos.” - 53



Resenha | Vermelho, Branco e Sangue Azul (Casey McQuiston)

 Por Catharina Lima


Para nossa sorte, Casey McQuiston saiu da autoestrada I-10, em 2016, e teve um vislumbre de como seria mudar as configurações atuais e encaixar problemáticas reais, romance divertido e comédia inteligente.

É fácil resumir Vermelho, Branco e Sangue Azul, mas nenhum resumo seria o suficiente para explicar a excelência do livro. Trazido ao Brasil, pela Seguinte, selo da Companhia das Letras, a obra de estreia de McQuiston, acontece durante os meses anteriores a eleição de 2020 dos Estados Unidos, sob o ponto de vista do filho caçula da presidenta Claremont, Alex.

                                                      Casey McQuiston

Em meio as estratégias para ganhar a reeleição, a Primeira-Família dos EUA é convidada para o casamento do príncipe herdeiro da Inglaterra, irmão do arqui-inimigo de Alex. Durante o evento real, Alex e o segundo príncipe na linha de sucessão, Henry de Gales, se envolvem numa briga e acabam reforçando a atenção já caída sobre eles. Unidas, as assessorias americana e inglesa arquitetam uma fantasia onde os dois rapazes são melhores amigos, a fim de evitar uma crise entre as grandes potências e manter as aparências na mídia. Contudo, Alex odeia fortemente o príncipe e, por alguma razão, não consegue tirá-lo da cabeça desde a adolescência.

Seu mau comportamento não pode vir a prejudicar a mãe, então o primeiro-filho aceita as condições impostas e se aproxima do príncipe. A descoberta da própria sexualidade é, como esperado, confusa e surpresa. No entanto, a personalidade metódica do personagem ajuda a passar pelo momento de forma divertida e cautelosa.

Caso você, leitor, também se sinta familiarizado com a ambientação, é porque foi intencional a estruturada para ser semelhante a que já conhecemos, exceto alguns detalhes configurados. A presidenta Claremont seria Hillary Clinton, se tivesse vencido as eleições após a saída de Obama; e o príncipe Harry, com todas suas escolhas contrárias, é a referência modificada para Henry, quem também vive sob o governo da rainha-avó.

Apesar de, assim como eu, muitos não estarem em posição de opinar com propriedade sobre o romance LGBT tratado, a forma fluída e sensível da escrita de McQuiston aproxima o casal da realidade e ajuda a desconstruir pensamentos retrógrados; questões como a descendência mexicana de Alex e sua pele escura também são cuidadas com a mesma preocupação e anseio.

Cada personagem tem papel fundamental, além de um contexto e individualidades. Eles dão gás e vida aos capítulos, dinâmica e diversão. A família de Alex, o melhor amigo e a irmã de Henry, são a rede de apoio necessária a todo ser humano.


Equilibrado de forma justa, o livro se divide entre um ambiente político e o romance LGBT, enriquecido com diálogos e piadas sagazes que trazem leveza à obra. Quem gosta de séries e filmes políticos vai se surpreender com a facilidade em visualizar as imagens à medida que os olhos avançam os capítulos. A leitura rápida cumpre todas as promessas e deixa o peso da saudade.

Vermelho, Branco e Sangue Azul foi lançado no Brasil, inicialmente em 2020, e na oportunidade além de ser alvo de expectativa em seu pré-lançamento, chegou para garantir um estrondoso sucesso. Agora, em nova roupagem, a Edição de Colecionador se torna um presente para os fãs da McQuiston e um grande agradecimento da Editora Seguinte, que comemora seus 10 anos de criada. 

Resenha | O Idiota (Fiódor Dostoiévski)

 Por Camila Moura


Quando a Companhia das Letras, através do selo Penguin-Companhia, apresentou para os seus leitores uma nova edição do clássico, O Idiota, não tive dúvidas em embarcar nesta grande jornada (literalmente), afinal sempre tive curiosidade de ler uma obra deste grande escritor russo, Dostoiévski.

Essa foi a minha primeira experiência coma literatura russa, e confesso que me surpreendeu muito positivamente. Apesar de ser um livro grande, a leitura é muito fluida, com dramas que lembram muito as tramas das novelas das 9.

“Fiquei muito admirado quando o príncipe há pouco tempo, adivinhou que eu tenho “sonhos ruins”; ele disse literalmente, que em Pávlovsk os meus “sonhos e emoções” vão mudar. E por que os sonhos? Ou ele é médico ou, de fato possui uma inteligência fora do comum e é capaz de adivinhar muitas coisas.” (Mas que, no final das contas, é um “idiota”, disso não há a menor dúvida).

Na narrativa conhecemos o jovem príncipe Míchkin que sofre de epilepsia, razão que o afasta por anos de São Petersburgo para tratamento médico. Conhecido como idiota, nosso jovem príncipe possui qualidades que estão em escassez entre os membros da sociedade Russa. Assim, quando ele retorna para a cidade, acaba se envolvendo em triângulos amorosos da alta sociedade. O que acaba causando um choque cultural e ele faz amigos e inimigos poderosos.

“- Aqui, não há ninguém que mereça essas palavras! – Explodiu Aglaia. – Todos aqui, todos, não valem o seu dedo mindinho nem a sua inteligência nem o seu coração! O senhor é o mais honesto de todos, o mais nobre de todos, o melhor de todos, o mais bondoso de todos, o mais inteligente de todos! Aqui, há pessoas indignas de se abaixar e pegar o lenço que o senhor deixou cair, agora.... Para que o senhor se humilha e se coloca abaixo de todos? Para que o senhor desfigurou tudo em si mesmo, por que não há orgulho no senhor?”

Nessa narrativa publicada originalmente em formato de Folhetim, podemos notar como a busca por dinheiro é capaz de ultrapassar as barreiras da moralidade e faz com que as pessoas vivam de aparências.